sábado, 20 de outubro de 2018

Folha: Documento confirma oferta ilegal de mensagens por WhatsApp na eleição


A Folha divulgou documento que atesta ação irregular para beneficiar candidatos via mensageiro - A prática ilegal pode ter alterado o resultado das eleições ainda no primeiro turno

Da Folha de S. Paulo

Documento confirma oferta ilegal de mensagens por WhatsApp na eleição

Proposta não aceita pela campanha de Alckmin pediu R$ 8,7 mi por disparos via aplicativo

Trocas de emails e a proposta de um contrato obtidas pela Folha confirmam a oferta de disparos em massa por WhatsApp a campanhas políticas, utilizando base de usuários de terceiros, em desacordo com a lei eleitoral.

A Croc Services formalizou proposta de R$ 8,7 milhões à campanha de Geraldo Alckmin (PSDB) à Presidência, usando nomes e números de celulares obtidos pela própria agência, e não pelo candidato.

A oferta de contrato da empresa, com data de 30 de julho e obtida pela Folha, cita opções diversas de disparos de mensagens por WhatsApp, com pagamento a ser feito até três dias antes da ação.

Marcelo Vitorino, coordenador da área digital da campanha deAlckmin, afirma que a campanha não comprou a opção de serviço usando base de terceiros, mas apenas com a lista de telefones de militantes e membros do PSDB e de apoiadores que forneceram dados nas redes do candidato —o que não é ilegal. Ele desembolsou R$ 495 mil pelos disparos, a R$ 0,09 cada um.

Pedro Freitas, sócio-diretor da Croc, afirmou não saber que a prática era ilegal. Ele disse que só prestou serviços para a campanha de Romeu Zema (Novo) ao governo de Minas, que gastou R$ 365 mil, e de Alckmin, com a base fornecida pelos partidos —Zema também diz que só comprou serviços com dados próprios.

Freitas disse ter uma base própria de usuários acumulada ao longo dos anos. Ele presta serviços ao setor privado. “Se as campanhas compraram a base de alguém eu não sei, mas o fato é que me mandaram a lista de telefones.”

Folha revelou na quinta-feira (18) que empresas compraram pacotes de disparos em massa de mensagens contra o PT no WhatsApp e preparavam uma grande operação na semana anterior ao segundo turno da eleição.

Entre elas estaria a Havan, do empresário Luciano Hang, que nega ter pago a agências por esses disparos e afirmou que vai processar a Folha.

A prática é considerada ilegal, pois se trata de doação de campanha por empresas, vedada pela lei, e não declarada.

Além disso, a reportagem mostrou que agências ofereciam às campanhas listas de telefones de WhatsApp segmentados por região geográfica, e às vezes, por renda.

Após a reportagem, o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) abriu ação para investigar a compra de disparos em massa e a procuradora-geral da República, Raquel Dodge, pediu à Polícia Federal inquérito para apurar o caso —ele foi aberto neste sábado (20), visando investigar mensagens em redes sociais tanto da campanha de Jair Bolsonaro (PSL) como de Fernando Haddad (PT).

Além disso, o WhatsApp baniu contas associadas às quatro agências citadas na reportagem, Quickmobile, a Yacows, Croc Services e SMS Market, e enviou notificação extrajudicial para que elas parem de enviar textos em massa e usar números obtidos a partir de base de terceiros.

O aplicativo também anunciou que baniu 100 mil usuários no Brasil nesta semana para conter desinformação, spam e notícias falsas. Flávio Bolsonaro, filho do presidenciável, teve a conta suspensa —depois, recuperou o número.

Conforme revelou o jornal O Globo na sexta (19), Marcelo Vitorino, da campanha de Alckmin, também já citou o nome de outra empresa, DOT Group, que, segundo ele, ofereceu a entrega de disparo de mensagens por WhatsApp para até 80 milhões de pessoas, usando cadastro de terceiros.

A oferta, feita em encontro na sede do PSDB em Brasília em 11 de julho, não foi aceita, segundo ele. A DOT Group nega ter oferecido o serviço.

A compra de serviços de disparo de WhatsApp por empresas para favorecer um candidato configura doação não declarada, além de vir de pessoa jurídica, o que é vedado.

Com isso, pode-se também incorrer no crime de abuso de poder econômico e, caso se considere que teve influência determinante, pode levar à cassação da chapa, caso o candidato esteja ciente.

Bolsonaro afirmou na quinta não ter “controle se tem gente fazendo isso”. Neste sábado, reafirmou não ter vínculo com as ações promovidas em disparos de WhatsApp contra o PT: “Eu não tenho nada a ver com isso”.

presidente do PSL, Gustavo Bebianno, disse que a reportagem da Folha é “fake news”. Neste sábado, afirmou ter pedido à PGR que apure o teor “até o último momento, de forma conclusiva, porque o PT tem a mania de acusar os outros daquilo que ele faz”.

No caso da campanha do PSDB, as mensagens enviadas por WhatsApp, com um vídeo, diziam: “Boa noite, tudo pronto? Daqui a pouco as urnas abrem e Geraldo tem um recado importante para você! Assista e encaminhe para seus contatos! Chegou a hora! É 45 na urna com amor e tolerância no coração”.

“Pelo volume de mensagens geradas em favor do Bolsonaro, é possível que sua campanha tenha sido beneficiada, mesmo que ele não tenha conhecimento pleno”, disse Vitorino, da campanha tucana.

“Existem muitas empresas que oferecem o serviço com bases de terceiros e será muito difícil conseguir comprovar a quantidade de mensagens enviada, bem como as fontes pagadoras, dado que muitas dessas empresas são informais”, afirmou ele.

Segundo Vitorino, a julgar pelo engajamento em redes sociais como Facebook e Twitter, é possível que outros candidatos tenham feito uso de ferramentas ilegais.

“O envolvimento de empresários em defesa de candidatos já foi comprovado pelo TSE, que, ao receber denúncia da campanha de Alckmin sobre o impulsionamento irregular de conteúdo, multou um empresário. Como não há nenhum tipo de monitoramento ativo, por parte das autoridades, é provável que muitos outros empresários tenham também feito impulsionamentos de políticos”, disse.

Ele se refere à denúncia que fez contra Luciano Hang, da Havan, que foi multado em R$ 10 mil pelo TSE por ter impulsionado publicações no Facebook que promoviam a campanha de Jair Bolsonaro.

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