Por Josias de Souza - uol
Num instante em que Bolsonaro manda às favas a
responsabilidade fiscal com o pretexto de acudir os brasileiros que Paulo
Guedes chama de "mais frágeis", surge na Câmara uma ala de deputados
fracos e oprimidos. Consideram-se desatendidos na partilha de verbas da xepa
das emendas orçamentárias secretas. Há no ar um aroma de escândalo.
O chorume que escorre pelos subterrâneos do Legislativo
é muito parecido com aquele que surgiu em setembro de 2004, quando começou a
ser pronunciada a palavra "mensalão". O melado engrossou até que, em
junho de 2005, o então deputado Roberto Jefferson chutou o balde. Nessa época,
Jefferson era aliado do PT. Hoje, é um bolsonarista radical.
Servindo-se do álibi social de destinar R$ 30 bilhões
em verbas extraordinárias para o novo Bolsa Família de R$ 400, o governo e seus
aliados no Legislativo tramaram a acomodação de um Bolsa Reeleição de R$ 83
bilhões numa laje acima do teto de gastos. Parte da verba será usada para gratificar
os maus costumes.
Criadas sem alarde em 2020, as chamadas emendas de
relator asseguraram neste ano de 2021 a partilha de algo como R$ 20 bilhões
entre os aliados do Planalto. A execução secreta rompeu um dique para o
escoamento de malfeitorias à margem dos órgãos de controle.
Os parlamentares dão de barato que o rompimento do teto
levará pelo menos R$ 16 bilhões para o dreno do Orçamento de 2022 que manterá
irrigados os pomares do centrão e hortas adjacentes no ano eleitoral. Daí a
chiadeira por uma distribuição equânime. Deseja-se usar parte da verba
extra-teto também para elevar de R$ 2,1 bilhões para R$ 4 bilhões o caixa do fundo
eleitoral.
A corrida por verbas ocorre numa hora em que o
presidente da Câmara, Arthur Lira, molha o paletó para aprovar uma emenda que
eleva a influência política do Congresso sobre o Conselho Nacional do
Ministério Público. Derrotado numa votação em que faltaram 11 votos para
atingir a marca dos 308 necessários à aprovação da proposta, Lira cogita
reiniciar o jogo, realizando nova votação.
Alega-se que o Ministério Público criminaliza a
política com seus inquéritos, mas se abstém de punir procuradores e promotores
que abusam do poder. Ainda não surgiu um novo Roberto Jefferson. Entretanto, se
o melado das emendas secretas continuar escorrendo, corre-se o risco do
surgimento de novas evidências de que a política é criminalizada por criminosos
que se apropriam de verbas do contribuinte.
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