Por José Álvaro Cardoso* - No Desacato
Um dos elementos importantes na complexa conjuntura
atual é o desconhecimento generalizado de história, típico da maioria de nós
brasileiros. Um desconhecimento, entenda-se bem, que decorre em boa parte, de
uma estratégia das classes dominantes para manter seu controle sobre os
trabalhadores. A ignorância da história, por parte da maioria, facilita muito a
dominação e manipulação política. A direita utiliza o desconhecimento histórico
para disseminar mentiras e teses completamente absurdas. Por exemplo, tem
surgido um debate nas redes sociais se o nazismo seria uma ideologia de
esquerda ou de direita. Um dos argumentos para os que defendem que o nazismo é
de esquerda, é que o partido de Hitler chamava-se Partido Nacional Socialista
dos Trabalhadores Alemães. A palavra “Socialista” no nome do partido, para
alguns, seria a comprovação de que o partido seria socialista. Parece
brincadeira, mas num contexto de amplo domínio da ignorância, muita gente
acredita nessas coisas.
Por isso vale conhecer um pouco A “Batalha da Praça da
Sé”, ou a “A Revoada dos Galinhas Verdes”, um dos desses momentos extremamente
importantes, para a luta dos trabalhadores brasileiros. E que é olimpicamente
ignorado pela maioria dos brasileiros. A dita batalha aconteceu no dia 7 de
outubro de 1934. Os integralistas, que eram seguidores do fascismo italiano e
do nazismo, convocaram uma manifestação com o objetivo de demonstração de
forças para a Praça da Sé, no centro de São Paulo. Para a manifestação vieram
integralistas também do Rio de Janeiro, e se calcula que os fascistas tenham
reunido cerca de 8 mil pessoas no evento. Os registros mencionam que havia no
dia, mais de 400 homens da organização fortemente armados no local combinado.
A partir de certa altura, os membros da organização
começaram a marchar e entoar seus hinos fascistas, tentando impressionar e
intimidar. No entanto, alguns gritos de “fora galinhas verdes” mostravam que
nem todo mundo estava disposto a assistir pacificamente as manifestações
nazifascistas. Setores da esquerda brasileira (Frente Única Antifascista,
Partido Comunista Brasileiro) haviam se organizado para enfrentar e acabar com
manifestação integralista na base da força. O entrevero começou com alguns
pequenos enfrentamentos. Mas o número de militantes de ambos os lados, num
ambiente de grande polarização política no qual o país, e o mundo viviam,
indicava um enfrentamento de significativa monta.
A temperatura ia aumentando quando, de uma hora para
outra, se ouviu uma rajada de metralhadora que atingiu Mario Pedrosa,
jornalista e importante dirigente político. Mario foi retirado da linha de fogo
por Fúlvio Abramo, outro jornalista e militante de grande destaque. Na
confusão, é atingido mortalmente o jovem comunista Décio de Oliveira, enquanto
fazia um discurso. A partir deste momento, inúmeros grupos de militantes de
esquerda, que estavam espalhados na área entram na luta contra os
integralistas. O embate foi duro, com o uso de armas de fogo dos dois lados.
Segundo os dados, morreram no confronto, além de Décio de Oliveira, pelo menos
seis guardas civis. Ante a determinação e a coragem dos trabalhadores, os
integralistas fugiram que nem galinhas em revoada, daí o nome jocoso da
batalha, “A Revoada dos Galinhas Verdes”.
Conta-se que apavorados, os integralistas, na fuga, iam
tirando e jogando fora, de qualquer jeito, as camisas verdes, para não serem
identificados pelos antifascistas. Segundo relato de gente que acompanhou o
acontecimento, ao final do dia, tinham várias camisas verde espalhadas pela
Praça da Sé. Não há um número preciso de quantos integralistas foram mortos ou
feridos. Mas, segundo os historiadores, a Ação Integralista Brasileira (AIB),
que havia sido fundada em 7 de outubro de 1932, pouco depois do conflito entre
as tropas de Vargas e os paulistas, não conseguiu mais se erguer depois da
“Revoada”. O humorista Barão de Itararé, diante do acontecido, ironizou: “Um
integralista não corre, voa”. O episódio foi muito importante para enfraquecer
o movimento integralista e, após a decretação do Estado Novo por Getúlio
Vargas, a ABI foi fechada.
A experiência histórica internacional mostra que os
movimentos fascistas, que costumam atacar pessoas mais frágeis que discordam de
suas ideias ou são identificados como “inimigos” (pobres, negros,
homossexuais), devem ser enfrentados com determinação, organização e coragem.
Não adianta apelos morais para quem está dominado pelo fanatismo. É bobagem
imaginar que a extrema direita será detida com apelos morais, chamados à razão
ou com iniciativas legais. Como são, no início, em geral uma minoria pequena,
costumam ser muito barulhentos e agressivos. Se não houver reação à altura, vão
tomando conta. Os difíceis dias atuais são a comprovação desse fato.
Tudo indica que a extrema direita não irá ganhar as
eleições porque, dentre outras razões, o seu candidato foi promovido a
“espantalho” do processo e deverá chegar bastante desidratado no 2º turno
(evidentemente esta é uma tendência. O cenário nebuloso dificulta qualquer
análise mais categórica). Mas passada as eleições, a tendência é a extrema
direita continuar aumentando sua agressividade, com a intenção de desencorajar
e reprimir a organização dos trabalhadores contra a destruição de direitos e
entrega das riquezas do país ao estrangeiro. Especialmente considerando o
elevado risco de golpe militar no Brasil. Que a história nos ajude a definir
estratégias eficientes.
*José Álvaro Cardoso é economista e supervisor técnico
do DIEESE em Santa Catarina.
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