Por Luis Nassif
Peça
1 - o xadrez e as análises estratégicas
Adotei o nome Xadrez na série sobre o golpe por duas
razões:
1.
Analisar realidades complexas.
Eventos dessa abrangência, que mexem com a vida e o
futuro do país, têm inúmeros fatores de influência se
entrelaçando, a crise econômica global, a política econômica interna, a
geopolítica internacional, os interesses corporativos internos.
O desafio consiste em identificar as grandes linhas de
mudança globais, a maneira como se interrelacionam no Brasil, os personagens
locais protagonistas desse jogo e a resultante final.
2.
Estimar efeitos sobre o futuro.
Trata-se de um exercício complexo, que depende em parte
de informação, e muito de intuição, de tentar identificar os desdobramentos de
fatos atuais, de processos políticos, sociais e econômicos, as linhas que
prevalecerão.
Os estrategistas se valem dessa metodologia para
prevenir desastres, acertar rumos, minimizar custos e riscos, desenhar o
futuro.
O desafio aqui é de fundo jornalístico, mais modesto.
Não se pretende ter as respostas definitivas, mas criar uma moldura, uma forma
organizada para que a discussão possa
fluir de maneira mais ordenada, aprimorando, confirmando ou retificando cada
peça e mesmo as correlações entre elas, com a inestimável contribuição de
vocês.
Peça
2 - os funcionários e as autoridades públicas
Autoridade é todo aquele que exerce parcela de poder.
Isso envolve uma responsabilidade adicional. Por isso mesmo não pode se ater
exclusivamente aos fatos do momento, mas aos desdobramentos presentes e
futuros.
O exercício de previsão dos atos presentes, os
desdobramentos futuros, são parte inerente da responsabilidade e de obrigação
dos que exercem poder de Estado.
É a diferença do mero servidor público, que age de
acordo com o princípio da legalidade, e à visão estática dos fatos.
Transportando as definições para a Lava Jato, a
Procuradoria Geral da República é a autoridade. Não é um dos poderes originais
do Estado - Executivo, Legislativo e Judiciário -, mas detém parcela de poder,
como a Polícia, pela margem de discricionariedade na aplicação da lei. A
discricionariedade existe para que se tenha o poder de decisão para aplicar
melhor o que diz a lei. Se fosse um exercício mecânico, bastaria um manual e um
computador.
Já os membros da força-tarefa são funcionários públicos
e, como tal, limitam-se ao cumprimento burocrático da lei. Mas, por ter
atribuições específicas de poder, também incorrem em um grau de
responsabilidade.
Peça
3 – a responsabilidade da Lava Jato
Voltemos ao tema do último Xadrez, o "Xadrez do
Assassinato Político e o MPF" (https://goo.gl/2Z5KOG).
Lá se mostra que a Lava Jato e o Procurador Geral da
República Rodrigo Janot exerceram um papel antinacional, de pacto com
autoridades norte-americanas visando ações contra uma estatal brasileira.
Não apenas isso.
O enorme estrago promovido na cadeia do petróleo e gás,
a destruição das empreiteiras, o desmonte da indústria de defesa, a tentativa
de criminalizar as ações comerciais e diplomáticas na África, tudo isso
configura claramente uma ação antinacional, embrulhada no pacote da
anticorrupção. Era perfeitamente possível apurar os crimes, punir os
corruptores e corruptos preservando as empresas. Mas optou-se por um trabalho
meticuloso de destruição.
Por ora, a enorme barreira ideológica de pós-verdade
imposta pela mídia tratou essa destruição como inevitável.
Mas a história não acaba em 2016. Em um ponto qualquer
do futuro, quando recomeçar o processo de reconstrução do país, haverá o
balanço inevitável desses anos de destruição. E não haverá como não se apurar
as responsabilidades.
De um lado, da parte dos que se darão conta dos enormes
prejuízos para o desenvolvimento nacional; de outra, dos que estão atrás de
revanche, políticos corruptos ou não, empresários presos, inocentes
desmoralizados.
Se, ao contrário dos tempos atuais, a força tarefa
tiver a sorte de ser julgada dentro das normas do estado de direito, serão
condenados com atenuantes. Como funcionários públicos, cumpriram apenas o que
dizia a lei. E se avançaram nos limites de lei, e os avanços foram endossados
por tribunais superiores, estarão a salvo de punições maiores.
São figuras menores que cresceram porque as
instituições se tornaram menores. No máximo serão personagens de crônicas de
costumes sobre o deslumbramento de mentes provincianas, quando o destino coloca
em suas mãos o martelo de Thor.
Peça
4 – a responsabilidade de Rodrigo Janot
Mas não haverá como eximir de responsabilidade o PGR
Rodrigo Janot.
Ele é a autoridade, a quem compete o discernimento para impedir os enormes malefícios que a
operação trouxe para o presente e o futuro do país, impor o freio na ação da
força tarefa, a definição de estratégias que assegurassem a punição dos
culpados sem a destruição da economia.
Daqui a alguns anos, quando o país estiver se
esfalfando para recuperar o tempo perdido, tentando desenvolver setores
competitivos para a luta da globalização, deparando-se com a regressão dos
indicadores sociais, de avanços tecnológicos, de modernização do trabalho,
ficará mais nítida a percepção de desperdício, da destruição inútil ocorrida nesses
tempos de dissipação. E não haverá como levantar mais o álibi da
inevitabilidade dos danos colaterais.
Juízes técnicos, isentos, como não são os de agora,
constatarão facilmente os inúmeros caminhos que havia para se coibir a
corrupção e punir os corruptos sem destruir a economia.
Disporão dos sucessivos alertas do que estaria
ocorrendo. Haverá condições de se ter acesso aos documentos e trocas de
mensagens da cooperação internacional e dos acordos montados individualmente
pela Lava Jato.
Certamente Janot alegará, em sua defesa, que as
pressões foram enormes, que não houve como enfrentá-las. E a acusação
constatará que ele falhou com seus deveres funcionais, com sua responsabilidade
em relação ao país.
Serão levadas à sua responsabilidade os milhões de
brasileiros que perderão oportunidade de sair da miséria pela destruição da
economia brasileira, os atrasos na infraestrutura, a perda de qualidade dos
empregos.
Durante algum tempo Janot dirigiu a Escola Superior do
Ministério Público da União. Nela, organizou diversos seminários sobre
problemas nacionais, onde foram esmiuçados cada um dos fatores de
desenvolvimento.
O trabalho meritório de antes será o agravante quando
tiver de responder a um tribunal. Não poderá acenar sequer com o álibi da
ignorância.
Que a maldição da nacionalidade abortada recaia sobre
ele e parceiros, como o ex-Ministro José Eduardo Cardozo, que viram as tropas
bárbaras avançando e, por cumplicidade, acomodamento ou medo, deixaram de
cumprir com seu dever perante o Brasil e perante a história.
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