Por Luciano Siqueira no Blog do Renato
Por meio digital, me chegou
um texto de uma das correntes do PT (que não consegui identificar) orientando a
militância a não participar de movimentos de oposição onde estejam presentes
grupos e personalidades que votaram em Bolsonaro para a presidência da
República.
Votaram, mas não votam mais.
Deslocaram-se para o campo
oposto e agora engrossam as fileiras dos que se batem pela democracia e
contribuem para desmascarar, enfraquecer e isolar o presidente e sua corrente
de extrema-direita.
“Não se misturar” é palavra
de ordem típica dos que não se sentem seguros de suas próprias convicções.
Nos primórdios do PT, na
campanha eleitoral de 1982 (quando me elegi deputado estadual pela primeira
vez), participei de um debate com um militante do sindicalismo rural, candidato
petista no mesmo pleito (que veio a obter pouquíssimos votos e não se elegeu).
A plateia era de operários metalúrgicos.
Meu oponente no debate
disparou uma crítica agressiva ao fato de eu ter participado, como orador, num
grande comício para mais de 20 mil pessoas no bairro de Casa Amarela, no
Recife, liderado pelo então candidato a governador emedebista senador Marcos Freire.
A crítica é que eu me
misturara com “políticos burgueses”.
Ao que contra-argumentei que
vira o meu crítico num pequenino comício, na Rua Nova, no centro da cidade, que
reunia não mais do que 20 ouvintes.
No comício de Casa Amarela,
meu público obviamente era infinitamente maior. E me permitira manifestar a
opinião própria do PCdoB (que ainda não havia recuperado a legalidade), como
candidato reconhecidamente comunista.
Ou seja, nos ombros de
lideranças daquela que se constituía, na prática, como uma frente ampla e
heterogênea, a voz de um comunista chegara às multidões durante toda uma
campanha memorável, apoiada na mobilização popular.
Participante de uma ampla e
diversificada coalizão que nem o óleo na água, que se junta mas não se dilui,
nem perde a identidade.
Adiante, a ditadura militar
acabou derrotada em eleição indireta que elegeu Tancredo Neves presidente por
uma frente amplíssima, a Aliança Democrática.
A tal corrente petista que
agora orienta seus militantes a se comportarem contra o que chamam de
“frenteamplismo” fecha os olhos para o inequívoco fato de que Lula e Dilma se
elegeram duas vezes para a presidência da República mediante coalizões
extremamente amplas e heterogêneas.
E, em minoria no Congresso
Nacional, celebraram alianças as mais diversas como condição de
governabilidade.
O último pleito presidencial,
que alçou à condição de governante o fascistóide Jair Bolsonaro, se constituiu
numa derrota histórica das forças democráticas para a extrema direita.
A muito custo tem sido
possível desmascarar perante a população o real caráter do presidente e do
grupo a ele vinculado. Não são apenas vozes à esquerda, são insatisfações
manifestadas por variadas correntes políticas e sociais, inclusive de
centro-direita.
E é bom que assim seja.
Não há outro caminho para
galvanizar o interesse, a emoção e a atitude oposicionista numa sociedade tão
complexa, desigual e diversificada.
A ideia da frente ampla
comporta interesses os mais diversos, é verdade. Por isso mesmo não é fácil de
se concretizar.
A realidade concreta, num
certo sentido, em determinados momentos atua com mais força do que os
interesses subjetivos dos múltiplos atores presentes na cena política.
Se uma conjugação de forças
assim tão ampla e multifacetada já tivesse ganho dimensão há alguns meses,
provavelmente se teriam gestado as condições do impeachment de Bolsonaro.
Os atos públicos previstos
para o próximo sábado ganham um contorno de frente ampla — e é ótimo que assim
seja.
Correntes políticas maduras e
consequentes certamente contribuirão para avançarmos num ambiente de “amplitude
heterogênea” indispensável à vitória eleitoral do campo democrático em 2022.
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