Após
o fim do regime militar, nos governos José Sarney, Itamar Franco, Fernando
Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, o Estado
brasileiro criou, a partir de legislação aprovada no Congresso Nacional, três
comissões para lidar com a responsabilidade do Estado em relação aos crimes do
período: a Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos, a Comissão
de Anistia e a Comissão Nacional da Verdade. Trata-se, portanto, de política de
Estado; não de governo.
O Instituto Vladimir Herzog vem a público repudiar de
forma veemente as alterações impostas à Comissão Especial sobre Mortos e
Desaparecidos Políticos (CEMDP). Por intermédio de decreto publicado hoje no
Diário Oficial da União, o governo exonerou quatro dos sete integrantes do
colegiado, substituindo-os por militares e integrantes do Partido Social
Liberal (PSL) – o partido de Jair Bolsonaro.
A tentativa de controlar a Comissão é mais um ataque da
inaceitável ofensiva de Bolsonaro contra todas as políticas públicas que, desde
a redemocratização, têm garantido à sociedade a realização do direito à
memória, à verdade e à justiça em relação aos crimes cometidos durante a
ditadura militar.
O entendimento de que, durante a ditadura, agentes do
Estado cometeram crimes contra a humanidade não é passível de revisão ou
questionamento. Pelo contrário: é amplamente comprovado por documentos,
depoimentos e até confissões daqueles que instauraram o terror na sociedade e
estiveram envolvidos em prisões arbitrárias, sequestros, torturas, assassinatos
e desaparecimentos forçados.
Ao agir assim, Bolsonaro desrespeita, mais uma vez,
normas e tratados internacionais de direitos humanos dos quais o Brasil é
signatário, e abre caminho para que o Estado brasileiro sofra novas condenações
e sanções de tribunais internacionais. No ano passado, a Corte
Interamericana de Direitos Humanos, ligada à Organização dos Estados Americanos
(OEA), condenou o Brasil por diversos crimes contra a humanidade cometidos
durante a ditadura militar – entre eles, o assassinato do jornalista Vladimir
Herzog.
Em todas essas condenações, foi determinado que o
Estado brasileiro se responsabilizasse por tais violações e promovesse uma
série de medidas de reparação às vítimas da ditadura – algo que Bolsonaro se
recusa a fazer.
Após o fim do regime militar, nos governos José Sarney,
Itamar Franco, Fernando Henrique Cardoso, Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma
Rousseff, o Estado brasileiro criou, a partir de legislação aprovada no
Congresso Nacional, três comissões para lidar com a responsabilidade do Estado
em relação aos crimes do período: a Comissão Especial sobre Mortos e
Desaparecidos Políticos, a Comissão de Anistia e a Comissão Nacional da
Verdade. Trata-se, portanto, de política de Estado; não de governo.
No caso dos desaparecimentos forçados, a ditadura
sempre omitiu informações sobre as circunstâncias de prisões e mortes daqueles
considerados opositores políticos. Durante anos, cidadãos brasileiros tiveram
de lidar com a angústia de não saber oficialmente o paradeiro de seus
familiares.
Após anos de luta e pressão dos familiares de mortos e
desaparecidos e de vítimas das violências do Estado, em 1995 foi criada a
Comissão Especial sobre Mortos e Desaparecidos Políticos. Desde então, foram
reconhecidas 479 vítimas. Só no ano passado, foram mais duas identificações de
corpos da Vala de Perus, descoberta em São Paulo em 1991 e ainda em investigação.
Por lei, os integrantes do colegiado têm que promover iniciativas capazes de
localizar e identificar vítimas da ditadura, e a nomeação deles não pode ser
arbitrária; tem que atender a critérios técnicos.
As conquistas obtidas pelas políticas públicas de
direito à memória, à verdade e à justiça, que o Brasil vem adotando desde 1995
são irreversíveis. Ao contrário do que deseja o atual presidente da República,
os crimes contra a humanidade, cometidos por agentes do Estado durante a
ditadura militar, não serão esquecidos.
O Brasil não pode mais conviver com tentativas de
revisionismo histórico, tampouco com relativizações das gravíssimas violações
de direitos humanos cometidas durante a ditadura militar, especialmente quando
isso parte de quem ocupa a chefia de governo.
O Instituto Vladimir Herzog apela às instituições
democráticas, sobretudo aquelas responsáveis por assegurar a manutenção do
Estado de Direito, que impeçam o desmantelamento da Comissão Especial sobre
Mortos e Desaparecidos Políticos. Exige também que o governo interrompa os
ataques às políticas públicas de direito à memória, verdade e justiça,
absolutamente fundamentais para a consolidação e o fortalecimento da democracia
no Brasil.
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