Entidades de defesa dos
direitos do consumidor condenam proposta estudada pela ANS que permite taxa
adicional por uso de procedimentos não previstos em pacote básico contratado
Por Marcelo da Fonseca – em.com.br
A publicação de norma pela Agência Nacional de Saúde
Suplementar (ANS) que vai regulamentar a partir do segundo semestre a cobrança
de franquia dos usuários de planos de saúde gerou críticas por parte de
associações e entidades de defesa dos direitos do consumidor. A regra está em
fase final de análise na agência reguladora e deve ser publicada em junho,
passando a valer no mês seguinte. Além da modalidade de coparticipação – em que
o cliente arca com parte dos custos de procedimentos toda vez que usa plano de
saúde e já é adotada por empresas – as operadoras poderão também vender planos
com franquia.
A opção das franquias, que será ofertada por planos de
saúde, terá similaridade com o que é praticado no mercado de seguro de veículos.
O consumidor pagaria mensalidade, com direito a alguns procedimentos básicos
gratuitos, mas se precisar de outros tipos de consultas, exames ou cirurgias
não previstos pelo plano teria de pagar do próprio bolso até atingir o valor da
franquia.
Um usuário que tem despesa mensal de R$ 500 por mês com
plano de saúde – total de R$ 6 mil no ano – não poderia gastar mais do que o
valor total pago ao ano com gastos extras relativos à franquia e a
coparticipação. A norma deve determinar também limite de pagamento mensal para
os que aderirem aos planos com franquia. O cliente que gasta mensalmente R$ 500
com o plano, não poderia pagar mais que o dobro do valor, ou seja, R$ 1 mil por
mês.
Oficialmente, a ANS informa que ainda não foram
estabelecidos percentuais e limites para coparticipação e franquia, mas alguns
detalhes já foram comentados por empresas do setor. A ideia é que a parte a ser
paga pelo cliente ao longo do ano referente à franquia e a coparticipação não
poderá ultrapassar o valor que ele pagou por 12 meses de mensalidade do plano.
A norma, hoje em análise pela Procuradoria da ANS, deve ser editada em junho. A
partir daí, as empresas teriam entre 120 e 180 dias para adaptação. A proposta,
no entanto, é recusada por empresas e especialistas em defesa do consumidor.
“A ANS precisa definir de qual lado ela está. Porque
parece que ela sempre busca o melhor para atender ao mercado e às operadoras de
planos de saúde. Criar franquias para o uso dos planos é uma aberração. Não se
pode comparar a saúde com sistemas usados para gastos com automóveis, em caso
de acidentes. Acho que os consumidores não vão aderir a esses modelos e espero
que a norma seja revista antes de entrar em vigor”, afirma a médica René
Patriota, coordenadora da Associação de Defesa dos Usuários de Planos e
Sistemas de Saúde (Aduseps).
Perda
no bolso
De acordo com a ANS, os planos com franquias podem ter
redução entre 20% e 30% no valor da mensalidade e podem ser interessantes para
pessoas que usam pouco os planos. No entanto, no caso de algum gasto
emergencial aparecer, o usuário pode ter que gastar do próprio bolso e a
economia acaba saindo caro.
Para Mario Scheffer, professor da Faculdade de Medicina
da USP e membro do conselho diretor do Instituto Brasileiro de Defesa do
Consumidor (Idec), a implementação dos modelos de coparticipação e a franquia
pode trazer prejuízo para usuários que recorrem ao plano com mais frequência,
como idosos e aqueles que têm doenças crônicas ou graves. “Essas opções (com
franquia) acabam sendo vantajosas para quem não usa muito o convênio médico”,
diz Scheffer.
Já o economista-chefe da Associação Brasileira de
Planos de Saúde (Abramge), Marcos Novais, destaca que estudos em países que
adotam as modalidades de contrato com franquia e coparticipação mostram que a
mensalidade dos planos fica cerca de 30% mais barata e que a mudança cria mais
opções para os consumidores brasileiros. Contudo, ele ressalta que as mudanças
valerão apenas para os novos contratos.
“A norma vai modernizar uma regra que já existe desde
1998. Não está se criando nada. De lá para cá, a sociedade mudou muito. As
regras, que ainda estão em discussão, não mudam em nada para os beneficiários
que já têm seus planos hoje, só para os novos. E os planos que estão
disponíveis nas prateleiras vão continuar sem mudanças”, explica Novais.
Segundo a ANS, a publicação pretende estabelecer regras
claras para franquia e coparticipação nos planos, que hoje respondem por 50%
dos contratos dos cerca de 47 mil beneficiários do setor. O objetivo é evitar disputas
judiciais causadas pela falta de regulamentação sobre limite de cobranças e de
um pacote mínimo de serviços.
Entenda
o caso
» Franquia ou coparticipação - No modelo de franquia,
assim como no sistema de seguros automotivos, o usuário paga um valor pelo uso
do serviço até atingir o valor da franquia, além da mensalidade. Alguns planos
podem estabelecer procedimentos gratuitos. Já na coparticipação, o segurado
arca com parte dos custos dos procedimentos cada vez que usa o plano. Nesse
caso, o percentual é definido de acordo com os contratos entre usuários e
operadoras.
» Teto para a cobrança de franquia - A proposta (ainda
em discussão) prevê um limite na cobrança de 12 vezes o valor da mensalidade.
Também deve ser criado limite máximo a ser pago por mês, que não poderá exceder
ao dobro da mensalidade paga pelo usuário. Caso haja saldo excedente, o valor
seria cobrado na fatura seguinte.
» Quando entram em vigor os modelos de franquia e
coparticipação - A coparticipação já é
adotada por vários planos. A franquia ainda não é adotada. A partir da
publicação da norma da ANS, prevista para junho, as empresas terão entre 120 e
180 dias para se adaptarem e implementar as novas regras. Segundo a ANS, as
mudanças valem apenas para novos planos de saúde.
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