Entrevista : Desembargador
aposentado Lédio Rosa de Andrade (Foto divulgação)
*Por Renato Igor, interino coluna do Moacir Pereira NSC
Nascido em Tubarão, aposentado no mês passado após 35
anos de magistratura, o ex-desembargador Lédio Rosa de Andrade, que ingressou
sábado no PT, começou a vida partidária com discurso forte: criticou o juiz Sergio
Moro, não escondeu os erros do PT e diz que a prioridade em Santa Catarina tem
que ser a ética.
Por que o senhor se filiou ao PT?
Sempre tive uma veia politica. Em 35 anos magistratura
sempre fiz política, nunca partidária, evidentemente. E quando pensava em me
aposentar, por essas coisas da vida, aconteceu. Minha filha foi fazer uma
cirurgia com o médico Ricardo Baratieri, marcamos um café, conversamos sobre a
cirurgia, eu tava muito preocupado. Ele me tranquilizou e me convidou pra
entrar no partido e concorrer a deputado. Logo depois o presidente do partido,
Décio Lima, me ligou, marcamos uma janta
e decidi entrar. Eu sei da crise ética que todos partidos passam, e o PT também
está envolvido, começando com a condenação do seu líder, que é o Lula.
Mas por que o PT?
Aí é que está o cerne da questão. A minha história de
vida não me leva a um partido de direita. A forma como penso economia e as
relações sociais me apontam do centro pra esquerda e não do centro pra direita.
O PT foi o único que me convidou e desde o suicídio do meu amigo reitor Luiz
Carlos Cancellier eu venho fazendo uma discussão profunda dos absurdos que vêm
ocorrendo dentro do Judiciário. No Judiciário existe gente muito boa, mas
existem juízes que estão destruindo o estado democrático de direito e usando
politicamente o Judiciário em benefício próprio, em benefício de causas que a
gente nem sabe quais são. Hoje, vejo muita gente falar. O Brasil está
radicalizado, contra Lula e a favor de Lula, nesse maniqueísmo. Sobre a
condenação do Lula, vejo pouca gente ler o processo e ver se tem prova
suficiente para condená-lo daquilo que estão acusando ele. A leitura que eu
faço é que esse processo está nesse rolo compressor dessa ala do Judiciário e
MP e polícia que não respeita os princípios constitucionais. E todos nós, que
hoje aplaudimos uma condenação apressada, muito cedo iremos nos arrepender. Não
há nada pior do que um país em que o direito não respeita as pessoas. Eu
ponderei muito, decidi aceitar. Porque se eu não fizer política, alguém vai
fazer. Então eu tenho que fazer junto, não posso me omitir.
O senhor será candidato ao governo?
O PT me convidou pra ser candidato a governador. Eu
disse que quero entrar pra fazer algo diferente. Se eu entro na política
discutindo cargo, eu já entro fazendo tudo igual a todos. Não quero entrar no
PT pra receber um cargo a ser disputado. Vou começar a me movimentar,
participar de reuniões, me aproximar. Vou conversar e vou deixar essa discussão
pra um segundo momento. Se for pra ser governador será, se for pra senador,
será, se não for pra nada, tudo bem. Eu quero construir algo. Não sei se os
militantes do PT querem. Será que há espaço pra mim nessa política do jeito que
eu penso? Eu quero ver isso primeiro pra depois decidir.
O PT não fez exatamente aquilo que sempre criticou?
As alianças, a corrupção, tesoureiros presos. O PT não
se afastou de suas origens? Estou entrando pra fazer uma política diferente
desse passado. Eu não quero fazer política desse tipo. O PT fez muita coisa
errada. Mas também, pra quem analisa com calma e racionalidade, principalmente
nos dois governos Lula, houve avanço social impressionante. E diminuição da
pobreza. Nem tudo está certo e nem errado. Houve, sim, grandes erros, que eu
não faria nunca. Eu entro dizendo que esse tipo de aliança eu não faço. A
corrupção, não é questão de defender o PT porque fizeram coisa errada, mas saiu
o ranking dos partidos em corrupção por parlamentar. O maior não é o PT. Na
Petrobras, a maioria dos cargos era do PMDB, não era do PT - o que não
justifica o que o PT fez. O que não entendo é porque se crucifica só o PT como
"o corrupto" e os outros não? No Brasil, só não está envolvido com
corrupção o partido que ainda não esteve no poder. A corrupção é um fenômeno
nacional, não um fenômeno partidário do PT e que tem que ser combatido com
muita força.
O PT deveria afastar quem foi condenado?
Essa é uma questão do conselho de ética, que não
conheço, as normativas internas de como funciona. Creio que precisa diferenciar
várias coisas; no caso de Lula, o PT tem certeza de que é condenação política
injusta. Se acham isso, afastar uma pessoa seria colaborar com a perseguição
política. Se você me pergunta se é possível desembargadores e o juiz Sergio
Moro condenarem injustamente? Eu respondo: é possível. Agora temos que ver o
que o STJ vai dizer.
O ex-presidente Lula, no mínimo, não teve uma relação
promíscua com empreiteiros que possuíam
contratos com o governo? No caso do sítio e do apartamento do Guarujá,
com envolvimento direto de engenheiros destas companhias?
Não posso responder porque não vi as provas. Se elas
existem eu preciso ver e elas me convencerem de que é um fato concreto ou fato
inventado. Eu respeito presunção de inocência. Eu, como jurista de 35 anos,
preciso estar muito convencido de que qualquer pessoa, mais simples ou mais
importante, está em situação demonstrada
de culpabilidade ou inocência. Se não fizer isso estou destruindo o estado
democrático de direito. Não se brinca com isso.
O senhor fala em referência ao uso do sítio, reforma
feita pela empreiteira e a reforma feita pelo engenheiro da empreiteira que tem
negócios com o governo e no caso do apartamento do Guarujá?
Eu sou desembargador, jogo xadrez. Todo ano vou nos
Jogos Abertos e fico em algum lugar. Esse ano, por exemplo, um colega desembargador
falou com um empresário amigo dele, que me emprestou um sítio. Fiquei uma
semana. Não conhecia o empresário, não sei quem é. Não sei se é corrupto ou
não. Fui na confiança do meu amigo. Se esse empresário estiver envolvido com a
Lava-Jato eu também estou? Me fotografaram, saiu no jornal que eu estava lá. E
daí? Eu preciso ver isso aí. Não sou advogado do Lula, mas numa parte do
Judiciário eu não confio.
Qual a prioridade em Santa Catarina?
Ética, fazer com que o dinheiro público seja aplicado em
obras publicas, priorizando educação e saúde. Segurança, que as pessoas colocam
como primeiro grande problema, isso é uma consequência. Estamos num momento de
insegurança porque nossa juventude não tem escola, trabalho, nossas crianças
não têm o que fazer. Claro, como estamos num momento extremo, não pode
negligenciar polícia, prisões. Mas nenhum país do mundo resolve problema de
violência criando prisões e contratando policiais. Em países sem criminalidade
as prisões estão fechando, são os casos da Suécia e da Noruega - porque
aplicaram em educação, saúde e isso trouxe trabalho para a maioria. Aí o crime
passa a ser exceção.
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