Reprodução/Facebook do Pastor
Takayama
Por João Filho no the
intercept Brasil
EM UMA MANOBRA pouco republicana
e nada cristã, a bancada da bíblia incluiu uma mudança constitucional em uma
PEC que pretendia apenas ampliar a licença-maternidade para mães de bebês
prematuros. A alteração, feita por uma comissão especial da Câmara, torna
ilegal qualquer tipo de aborto, inclusive em casos de estupro e anencefalia do
feto. A aprovação da malandragem foi feita durante um rápido intervalo em que a
sessão do plenário foi derrubada por falta de quórum e sem a presença da
oposição.
Em 2012, o STF
permitiu o aborto em caso de anencefalia. O Código Penal de 1940,
implementado há quase 80 anos, permite o aborto em casos de estupro. Mas nada disso
importa para a bancada da bíblia, que segue em sua missão divina de reverter
esses avanços civilizatórios.
Sem nenhum respeito pela laicidade do Estado, um grupo
de homens medievais impôs suas crenças goela abaixo de todas as mulheres
brasileiras. Por 18 votos masculinos contra 1 feminino — o de Erika Kokay
(PT-DF) — a comissão aprovou a barbaridade aos
gritos de “Vida sim, aborto não!”. Só ficou faltando empunharem tochas
para completar o cenário.
A decisão da comissão ainda passará pelo crivo do
plenário da Câmara, onde dificilmente
será aprovada, mas mostra do que as forças reacionárias são capazes.
Mas quem são os 18 deputados que querem legislar sobres
os corpos das mulheres com base nas sua convicções religiosas? Tracei um breve
perfil desses homens de Deus:
Evandro Gussi (PV-SP): Advogado,
empresário e professor de instituto ligado à Renovação Carismática Católica,
este católico carismático foi quem presidiu a comissão que tornou ilegal o
aborto em qualquer circunstância. Ele venceu a eleição em 2014 com ajuda
decisiva da TV Canção Nova, onde aparecia com frequência. Aborto sempre foi
o tema principal da sua campanha e depois na sua atuação como
parlamentar. Apesar da religião ter papel fundamental na sua vida, Gussi
jura de pés juntos que sua posição favorável à criminalização é
puramente racional: “Eu tenho a minha religião, mas em toda a minha
argumentação eu não recorro a nenhum argumento religioso para ser contrário ao
aborto, meus argumentos são totalmente racionais, a partir de um raciocínio
filosófico e que a Constituição garante que eu posso tê-lo”
Mauro Pereira (PMDB-RS): Conhecido
em Caxias do Sul por aparecer ao lado de políticos importantes nas fotos dos
jornais e TV, o papagaio de pirata é também autor das seguintes
frases: “Michel Temer é trabalhador e honesto”, “Quem votar contra
(arquivamento de denúncia contra Temer) detesta o Brasil”. Foi um fiel
escudeiro de Cunha até o dia da votação da sua cassação, quando
decidiu abandonar o companheiro ferido na estrada.
Givaldo Carimbão (PHS-AL): Coordenador
da Frente Parlamentar Católica da Câmara, o católico fervoroso Givaldo se
mostrou um dos mais indignados com a mostra Queermuseu.
Em audiência pública na Câmara, o valoroso cristão disse
para o ministro da Cultura que “queria pegar a mãe e a filha do
ministro e colocar de perna aberta como nas fotos”. Quanto respeito pelas
mulheres, não?
Alan Rick (DEM-AC): Jornalista,
apresentador de TV e pastor evangélico, o acreano foi eleito pelo PRB, partido
da Igreja Universal, antes de mudar para o DEM. Usou verba parlamentar para
contratar empresa para monitorar seus críticos nas redes sociais.
Evandro Gussi, João Campos e Jorge
Tadeu Mudalen conversam durante comissão especial da Câmara Luis Macedo/Câmara
dos Deputados
Marcos Soares (DEM-RJ):
Filho do pastor Romildo Ribeiro Soares, mais conhecido como Missionário R. R.
Soares, o deputado tem uma atuação tímida, quase nula na Câmara. Mas em 2015,
Marcos Soares apresentou
um projeto de lei que pretendia transformar as autorizações para as
TVs por assinatura, transmitidas em canais UHFs, em canais abertos de
televisão. Se o projeto tivesse sido aprovado, o seu papi passaria a ter sua
própria TV aberta para divulgar sua religião.
Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP):
É frequentador da Igreja Internacional da Graça de Deus e amigo
do seu proprietário, o pastor RR Soares. Segundo levantamento
feito pela Folha, o deputado apareceu em primeiríssimo lugar como o que
mais viajou pelo mundo com tudo pago (passagem aérea, hospedagem, alimentação e
transporte local) pela Câmara. De 2010 a 2016, Mudalen fez 28 viagens e visitou
países das Américas, Europa e Ásia.
Leonardo Quintão (PMDB-MG): Filho
do pastor evangélico, fazendeiro e prefeito de Ipatinga, Sebastião Quintão,
Leonardo cumpre seu terceiro mandato consecutivo. É representante das
mineradoras e teve 42% da sua última campanha financiada
por empresas ligadas à mineração. Seu irmão é empresário da área
de mineração e foi um dos doadores da campanha. Aliado forte de Eduardo Cunha,
Quintão foi um dos seus principais defensores no Conselho de Ética que cassou
seu mandato. Foi também o deputado
mineiro que mais recebeu recursos via emendas parlamentares nos meses
que antecederam a votação da primeira denúncia contra Temer na Câmara.
Conhecido por suas posições moralistas e conservadoras, Quintão tentou em
2015 beneficiar
um shopping com um empréstimo milionário do BNDES de forma sorrateira. De
2010 a 2015, o patrimônio do nobre deputado cresceu
apenas 584%.
Pastor Eurico (PHS-PE):
O pastor da Assembleia de Deus é um entusiasta do período de chumbo e chegou
a afirmar que
“o governo militar foi solução para o Brasil”
Joaquim Passarinho (PSD-PA): Católico,
o sobrinho de Jarbas Passarinho é conhecido no estado do Pará como Quinzinho.
Foi autor da inacreditável lei que tornou obrigatório o fornecimento
de fio dental por bares e restaurantes do estado.
Gilberto Nascimento (PSC-SP): Advogado
e ex-delegado de polícia ligado
à Assembleia de Deus. Em seu primeiro mandato como deputado federal em
2003, foi denunciado por participar do Escândalo dos Sanguessugas e acabou
sendo indiciado
pela Polícia Federal em 2007 por formação de quadrilha, corrupção
passiva e lavagem de dinheiro.
Sóstenes Cavalcante (DEM-RJ):
Além de ser apadrinhado
por Silas Malafaia, dono da Assembleia de Deus Vitória em Cristo, Sóstenes
é pastor da mesma igreja. Em 2015, numa audiência pública da Comissão de
Direitos Humanos da Câmara, o nobre pastor sugeriu a criação de uma “bolsa
ex-gay” para homossexuais que se convertessem à heterossexualidade.
Antônio Jácome (PODE-RN): Ah,
esse aqui é um caso muito interessante. Ex-pastor da Assembleia de Deus, Jácome
virou manchete em todos os jornais do Rio Grande do Norte em 2011. É que ele
foi alvo de uma investigação da cúpula da Igreja e foi condenado por
unanimidade pelas acusações de adultério e por ter incitado um…aborto. Segundo
o jornal potiguar “O Mossoroense”, o parlamentar enviou carta
admitindo os pecados, mas de nada adiantou. Jácome perdeu o título de pastor e
ficou proibido de subir ao púlpito das igrejas da Assembleia de Deus. Ele não
pode mais pregar na igreja, mas continua pregando normalmente na Câmara.
João Campos (PRB-GO):
É pastor auxiliar da Igreja Assembléia de Deus de Vila Nova, Goiás. Em 2011,
quando era do PSDB, foi o autor
do hediondo projeto conhecido como “Cura Gay”. Foi também autor
da PEC99/2011,
que dá às igrejas o poder de questionar leis junto ao STF. Passou a ser
investigado pelo Ministério Público após ser acusado
por uma ex-funcionária de ficar com parte do salário dela entre 2004 e
2008.
Jefferson Campos (PSD-SP): É
pastor da Igreja do Evangelho Quadrangular. Quando vereador em Sorocaba, tentou
emplacar uma lei que incluía o Criacionismo no currículo da rede municipal da
cidade. O valoroso cristão teve seu nome presente em diversos casos de
corrupção. No Escândalo
dos Sanguessugas em 2006, foi acusado por corrupção passiva,
associação para o crime e fraude em licitações. Ele teria recebido R$ 15 mil de
propina para direcionar verbas de emendas parlamentares para compra de
ambulâncias acima do preço, além de um ônibus para a campanha de um cunhado
candidato a vereador. Foi absolvido pelo STF por falta de provas. Mas Deus
tinha planos maiores na vida deste homem. Em 2007, ele conseguiu ser denunciado
duas vezes: a primeira pelo MPF de São Paulo por improbidade
administrativa, a segunda pelo MPF do Mato Grosso por formação de
quadrilha, corrupção passiva e fraude em licitações.
Diego Garcia (PHS-PR):
Considerado o principal líder da bancada da bíblia, o paranaense é ligado
à Renovação Carismática Católica. Diego também foi relator do projeto de lei
que cria o Estatuto da Família e deu o parecer no qual define a família como a
união entre homem e mulher. O mesmo moralismo que apresenta como parlamentar
parece não se repetir em sua vida privada. Ele foi denunciado pelo Ministério
Público por corrupção ativa sob acusação de subornar uma agente do Detran. Essa
criaturinha de Deus foi flagrada em escutas telefônicas comprando a CNH. O caso
prescreveu em 2015. Em 2016, este católico carismático teve a ousadia de enviar
um projeto de lei à Câmara para tornar a cidade de Curitiba a Capital
Nacional Anticorrupção, uma singela homenagem à Operação Lava Jato.
Flavinho (PSB-SP):
Missionário na comunidade católica Canção Nova por 27 anos, Flavinho é um
antissocialista do partido socialista. Se posicionou contra a Comissão de
Defesa dos Direitos da Mulher na Câmara e afirmouque “as mulheres
não querem empoderamento. Querem ser amadas, querem ser cuidadas”
Eros Biondini (PROS-MG): Integrante
da Renovação Carismática Católica e fundador da Missão Mundo Novo, o deputado
mineiro é o idealizador do “Cristo é o Show”, maior evento musical católico do
país, além de ter sido apresentador do programa “Mais Brasil” da TV Canção
Nova. Tem vários discos de músicas religiosas lançados. Este homem de Deus
esteve na mira da PGR por apresentar
notas frias para justificar gastos públicosquando estava na Assembleia
Legislativa de Minas. Logo após ser denunciado, virou secretário de Esportes do
governo Antonio Anastasia (PSDB-MG).
Paulo Freire (PR-SP): É
pastor da Assembleia de Deus. Seu pai e seus irmãos também são pastores.
Foi acusado pelo Ministério Público de integrar a Máfia
do Asfalto.
Como se vê, a moral e os bons costumes dos patrulheiros
do corpo alheio não resistem a uma googlada.
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