“É uma coisa da qual
nunca vou me recuperar”, disse-me durante um longo depoimento no escritório de
seus advogados, no dia 20 de setembro.
por Carlos Damião
No longo depoimento que me concedeu no dia 20 de
setembro de 2017, no escritório de seus advogados, o reitor da UFSC
(Universidade Federal de Santa Catarina), Luiz Cancellier, desabafou: “É uma coisa
da qual nunca vou me recuperar”. Não se referia apenas à Operação Ouvidos
Moucos, desencadeada pela Polícia Federal, com autorização da Justiça Federal,
que apura supostos desvios no programa de bolsas de ensino a distância do curso
de Administração. Mas à forma degradante como foi tratado quando foi
transferido da sede da PF para o Presídio da Agronômica. “Todos os presos são
tratados assim, despidos, constrangidos, com as partes íntimas revistadas.
Depois são encaminhados ao pessoal do DEAP (Departamento de Administração
Prisional), para serem acomodados nas celas”.
Pós-doutorado em Direito, respeitado no Brasil e no
exterior por suas pesquisas no campo do Direito Administrativo, Cancellier
estava desolado por causa da forma como ocorreu sua prisão. Com endereço
conhecido, disse que estaria sempre à disposição da Justiça e de qualquer
investigador da Polícia Federal, da CGU (Controladoria Geral da União) e do TCU
(Tribunal de Contas da União). “Jamais me recusaria a prestar esclarecimentos e
colaborar com as investigações, que não abrangiam nossa gestão, mas as
anteriores, desde 2006”, observou.
Cancellier disse-me naquele dia que contava com o apoio
da comunidade acadêmica, dos amigos e dos familiares. “É com a força dessas
pessoas que eu vou provar minha inocência”, declarou.
Saímos do gabinete dos advogados e fomos para a rua.
Oito meses depois que havia parado de fumar voltou a curtir umas baforadas. Foi
nosso último encontro, fumando dentro do carro, lembrando histórias da nossa
juventude, da militância no movimento estudantil, do congresso de reconstrução
da UNE, em 1979, do qual participamos como delegados da UFSC.
Em dois artigos (aqui e aqui) posteriores à prisão, publicados na minha
coluna do ND On-line, o advogado e ex-senador Nelson Wedekin trouxe
considerações indignadas contra a violência sofrida pelo reitor. Disse Wedekin,
amigo e companheiro de Cancellier nas duras lutas contra a ditadura
civil-militar de 1964-1985: “Estamos então em que para evitar suposto,
possível, hipotético, incerto e duvidoso constrangimento, submeteram Cancellier
e mais seis cidadãos a um constrangimento imediato e brutal. Ou uma prisão, do
modo como se deu, mesmo sem culpa formada, não é um constrangimento tão
profundo que nunca se esquece e apaga?”.
Quem matou o reitor, um homem apaixonado pelo trabalho,
pelo Direito e pela UFSC?
Nenhum comentário:
Postar um comentário