Foto: Tânia
Rêgo/Agência Brasil
Por Jornal GGN
O juiz federal Alcir Luiz Lopes Neto, de Petrópolis
(RJ), usou a Lei da Anistia para impedir uma ação penal contra o Antônio Waneir
Pinheiro, militar acusado de sequestrar, torturar e estuprar, durante o regime
militar, Inês Etienne Romeu, ex-presa política que sobreviveu à Casa da Morte.
Segundo reportagem do Justificando, além de citar a Lei
da Anistia, o magistrado usou passagem do escritor Olavo de Carvalho que diz
que direitos humanos não deve ser concedido a uma minoria selecionada.
Por Fernanda Valente no Justificando
Inspirado em Olavo de Carvalho, Juiz rejeita denúncia
por estupro sofrido por presa política
Com citação a Olavo de Carvalho, a Justiça Federal de Petrópolis (RJ) rejeitou a denúncia do Ministério Público Federal (MPF) pelo estupro da ex-presa política e única sobrevivente da Casa da Morte, Inês Etienne Romeu. Inês foi sequestrada por agentes da ditadura militar em maio de 1971 e encaminhada ao centro de torturas montado pelo Exército em Petrópolis, a Casa da Morte, onde foi torturada e estuprada pelo militar Antônio Waneir Pinheiro de Lima, conhecido como “Camarão”. A decisão foi publicada nesta quarta feira, 8.
Após anos de pesquisa, o Ministério Público Federal
(MPF) chegou a “Camarão” como autor dos estupros contra a presa política. No
entanto, o Juiz Federal Alcir Luiz Lopes Neto rejeitou a denúncia sob a
fundamentação de que desrespeitaria à Lei de Anistia, bem como a prescrição de
crimes. “Além de ser caso de desrespeito ao direito adquirido em razão da
Anistia de 1979 [do STF], o caso também é de evidente desrespeito a outro
direito adquirido do acusado, tendo em vista a verificação da prescrição: o de
tentar fazer retroagir uma “norma” de caráter penal com a finalidade de
prejudicar o acusado“, afirma na decisão.
O juiz diz ainda que “nem sequer existe uma lei que
estabeleça a retroatividade no caso”. Ele justificou que independente da quantidade
de reportagens e entrevistas que foram apresentados, estes “não se caracterizam
como documentos que possam servir como prova de fatos no juízo penal“. Para
negar o pedido, o juiz ainda fundamentou a decisão em processos e condenações
de Inês pela Justiça Militar na época da Ditadura, como, por exemplo, o
“agrupamento que, sob orientação de governo estrangeiro ou organização
internacional, exerce atividades prejudiciais ou perigosas à Segurança
Nacional”.
Ao final, o Juiz trouxe Olavo de Carvalho, conhecido
escritor que inspira reacionários no país, para dizer que a proteção ao estupro
sofrido por presos políticos na ditadura seriam “vantagens a minorias
selecionadas”- “Como escreveu Olavo de Carvalho, ninguém é contra os “direitos
humanos”, desde que sejam direitos humanos de verdade, compartilhados por todos
os membros da sociedade, e não meros pretextos para dar vantagens a minorias
selecionadas que servem aos interesses globalistas”.
Nas redes sociais o procurador da República no Rio,
Sérgio Suiama, um dos autores da denúncia, afirmou que é lamentável a decisão,
publicada justamente no do dia internacional da mulher. A decisão, para Suiama,
“ignora ou desqualifica todas as provas obtidas e, o que é pior, desqualifica o
valor da palavra da vítima do estupro, dizendo que o fato só foi relatado após
8 anos do ocorrido, como se fosse possível à vítima ir a uma delegacia de
polícia em 1971 registrar queixa contra os militares que a violentaram e
torturaram“.
De acordo com as informações da Agência Brasil,
enquanto estava presa, Inês tentou se suicidar duas vezes e, depois de deixar a
Casa da Morte ela ainda cumpriu oito anos de prisão. Inicialmente, sua
condenação era à prisão perpétua, mas a Lei da Anistia a limitou aos oito anos
já cumpridos pela participação no sequestro do embaixador suíço Giovanni Enrico
Bucher, em 1970.
Inês faleceu aos 72 anos, em abril de 2015, por
insuficiência respiratória. A ex-presa política dedicou a vida a esclarecer os
crimes da ditadura e direitos humanos, auxiliando os trabalhos da Comissão
Nacional da Verdade e do Ministério Público Federal, e recebeu em 2009 o Prêmio
de Diretos Humanos, na categoria Direito à Memória e à Verdade.
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