por Sebastião Nunes no GGN
Classe média é um estado de espírito, ao contrário do
que pensam sociólogos, economistas, publicitários, juristas, políticos e
estatísticos.
As duas principais características da classe média são
consumismo exacerbado e individualismo predador. A união dessas duas
características cria o típico estado de espírito inclâmico, voltado para a
destruição em massa de ambientes, bens e pessoas, gerando o individuo que
denominei inclame.
Foi o surgimento das grandes cidades que propiciou a
amplificação dessas duas características até o grau extremado que se verifica
hoje.
Nas cidades pequenas o vizinho era visto como um ser
humano a quem se devia um mínimo de respeito e, frequentemente, de
solidariedade. Ninguém desperdiçava nada e se consumia apenas o necessário.
Fauna, flora e seus habitats naturais existiam em harmonia com os humanos,
apenas perturbados esporadicamente pelos, digamos assim, pré-inclames.
Tudo
isto acabou.
Basta bater perna por alguns minutos pelas avenidas
Paulista (SP), Rio Branco (Rio) e Afonso Pena (BH) para confirmar tal verdade
(sic) ao vivo e in loco. Nas demais cidades grandes é a mesma coisa: todos são
inimigos anônimos.
O sonho de qualquer indivíduo de classe média (inclame)
é se tornar panderoso (aquele que pode tudo), sofrendo absoluto pavor de se
tornar mauserável (a ralé social).
Num resumo grosseiro, as castas atuais se distribuem assim:
INCLAMES
São os ratos, baratas, pernilongos, gafanhotos, chatos,
carrapatos, bichos-de-pé, percevejos, piolhos, pulgas e muquiranas da espécie
humana. Representam cerca de 75,00% de todos nós e são imortais, reproduzindo-se
por cissiparidade, capilaridade, proximidade, aglutinação e osmose. Tendem a
constituir, até o final do século, 99,99% da população.
PANDEROSOS
Os que podem tudo. Constituem cerca de 0,01% da
população, sendo invisíveis a olho nu. Jamais caem do cavalo. Personificam, em
sua fechadíssima casta, o ideal supremo dos inclames, que, em todos os casos e,
sem nenhuma exceção, aspiram a se tornar panderosos, o que muito rarefeitamente
acontece, e só através dos absolutamente canalhas. Só estes, pela canalhice
absoluta (aprovada e aplaudida pelos panderosos), conseguem ascender ao nível
dos panderosos, com os quais, finalmente, se igualam, passando a usufruir
fatias do poder.
MAUSERÁVEIS
São, por exclusão, todos os que não sejam panderosos ou
inclames. Representam hoje cerca de 24,99% da população e incluem artistas
utopistas, intelectuais inteligentes (pois que os há burríssimos) indivíduos de
espírito muito rico ou muito pobre, bandidos pobres (os ricos estão no poder
representando os inclames) e os marginais de todas as marginálias. Sempre caem
do cavalo, mesmo dos pangarés mais lerdos. Na maioria – desgraçadamente –,
sonham secretamente se tornar inclames.
ESMIUÇANDO
OS CONCEITOS
Basta por hoje. Com vagar e paciência, desdobrarei os
conceitos acima, de modo que todos se certifiquem de que os tempos mudaram.
Estamos vivendo uma época até há pouco inconcebível, em que uma direita
absolutamente autoritária, desnorteada, burra e ignorante dá as cartas, todos
os tipos de cartas, montada numa oposição que finge ser oposição.
Quantos anos de inclamidade nos esperam? Não sei.
Ninguém sabe.
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