Do Jornal
GGN
Com benefícios como vale-alimentação, auxílio-moradia,
auxílio-livro, auxílio-funeral, pagamento de diárias e remunerações
retroativas, quase 80% dos membros do Ministério Público do Estado de São Paulo
recebem acima do teto-constitucional, de R$ 33.736.
Segundo a Agência Pública, o governo estadual
encaminhou proposta de orçamento do MP com previsão de R$ 2,3 bilhões para
2017, um valor duas vezes maior do que devem receber a secretarias de
Agricultura, Meio Ambiente ou Habitação.
A Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo prevê
16 auxílios extras para os membros do Ministério Público estadual, o que
explica vencimentos que chegam a quase R$ 130 mil por mês.
Leia mais abaixo:
Da
Agência Pública
Direito
ou privilégio?
Quase 80% dos membros do MPSP recebem acima do teto
constitucional: vale-livro, auxílio-moradia e supersalários somam até R$ 130
mil por mês
por Daniel Mello, Eliane Gonçalves
Em setembro, o governo de São Paulo encaminhou para a
Assembleia Legislativa do Estado a proposta de orçamento do Ministério Público
(MP) para 2017. A previsão é destinar R$ 2,3 bilhões para manter funcionando a
estrutura criada para defender os direitos dos cidadãos paulistas. Um orçamento
três vezes maior do que o previsto para a Secretaria de Cultura e o dobro do
que será destinado para pastas como Agricultura, Meio Ambiente ou Habitação. É
com esse dinheiro que o MP vai cobrir gastos com água, luz, telefone, salários
– e os polpudos benefícios destinados a procuradores e promotores.
A remuneração inicial de um promotor público em São
Paulo é de R$ 24.818,71. Na última etapa da carreira, o procurador de justiça,
o salário chega a R$ 30.471,11. São valores que seguem o teto constitucional:
promotores e procuradores paulistas recebem, no máximo, 90,25% do salário de um
ministro do Supremo Tribunal Federal.
Mas os vencimentos não terminam por aí. Somam-se
benefícios como vale-alimentação, auxílio-moradia, auxílio-livro,
auxílio-funeral, pagamento de diárias, remunerações retroativas, duas férias
anuais. A Lei Orgânica do Ministério Público de São Paulo, de 1993, prevê 16
auxílios extras que, apesar de serem considerados legais, ajudam a ultrapassar,
em muito, o teto constitucional.
Na prática, dos 2015 membros do MPSP que receberam
salário em outubro, 1243 receberam a partir de R$ 38,900, ou seja, 61,7% do total. É um valor acima dos R$
33.763 pagos aos ministros do STF, mais os extras. Se prosperar o entendimento
de que “teto é teto” e os “extras” não deveriam estar nem na conta dos ministros
do Supremo, a proporção de promotores e procuradores que receberam acima do
teto constitucional sobe para 79,8%. Foram 1.608 promotores e procuradores que
receberam mais do que o salário teto de R$ 33.736.
Estímulo
à leitura
A Comissão foi instalada, em novembro, no Congresso
Nacional, para propor um fim aos “supersalários” de funcionários públicos.
A folha de pagamento do MPSP de outubro é repleta de
exemplos de “supersalários”. Naquele mês o promotor de justiça de entrância
final Milton Theodoro Filho, lotado na capital, recebeu o maior valor da folha:
R$ 129.469,78. Foram R$ 28.947,55 de salário bruto (sem descontar a
contribuição previdenciária e o imposto de renda) e R$ 89.979,35 de
indenizações (incluídos R$ 5.087,73 auxílio-moradia e vale-alimentação). Além
disso, há mais R$ 9.179,62 de valores retroativos da Parcela Autônoma de
Equivalência (PAE), resultado de uma decisão de 1992 do Supremo Tribunal
Federal (STF) que equipara os salários do Judiciário com os do Congresso
Nacional.
No mesmo mês, o promotor Julio César Palhares, que
serve em Bauru, no interior paulista, recebeu R$ 118.480,60. Desse montante, R$
28.947,55 referem-se ao salário bruto, R$ 82.281,19 a indenizações não
discriminadas, à exceção de R$ 5.087,73 de auxílio-moradia e vale-alimentação.
Orlando Bastos Filho, promotor em Sorocaba, foi o
terceiro membro com maiores vencimentos no mês, recebendo R$ 107.025 brutos.
Nesse valor estão incluídos R$ 64.901,22 de indenizações não discriminadas e R$
7.864,41 retroativos da PAE. Em 2015, Bastos Filho acirrou os ânimos dos
vereadores do município ao iniciar uma investigação sobre seus gastos com
despesas de telefone, carro oficial e itens de escritório.
O professor de ética e filosofia política na Unicamp
Roberto Romano estuda o poder Judiciário e defende o papel do MP como
instituição de garantia da democracia brasileira. Mas critica: “Eu acho que o
Ministério Público, justamente porque é o zelador da lei, o fiscal da aplicação
da lei, deveria renunciar a esse tipo de acréscimo ao seu salário, sobretudo
porque não corresponde à experiência de todos os demais funcionários do
estado”.
As informações sobre os rendimentos dos membros do MP
estão disponíveis no Portal da Transparência. Veja abaixo a lista dos 20
membros mais bem pagos do MP paulista em outubro:
Auxílio-moradia
O maior benefício é o auxílio-moradia, no valor de R$
4.377 mensais. A ajuda financeira foi autorizada por meio de liminar do
ministro do STF Luiz Fux em setembro de 2014 e se estende a membros da
magistratura e dos ministérios públicos de todo o país. À diferença do que
ocorre com todos os outros funcionários públicos – até mesmo dos congressistas
–, o benefício se destina também para quem tem residência própria e vive na
mesma cidade em que atua. Ficam de fora apenas aposentados e licenciados.
Segundo a folha de pagamento de outubro de 2016,
disponível no Portal da Transparência do MPSP, dos 2.084 promotores e
procuradores públicos na ativa, pelo menos 1.593 recebem o auxílio (76%). O
custo anual para os cofres públicos é de aproximadamente R$ 69,7 milhões. O
valor daria para atender mais de 14 mil famílias com o programa Auxílio-Aluguel
da prefeitura de São Paulo, de R$ 400 mensais.
Mas a despesa não fica por aí. O adicional foi tratado
como retroativo pelo ministro Luiz Fux. Assim, promotores e procuradores
tiveram direito a receber os “atrasados” dos cinco anos anteriores à liminar,
ou seja, desde 2009. Para a maioria da classe, isso significou uma bolada de
mais de R$ 262 mil que vem sendo paga em parcelas regulares desde então.
Outro auxílio que ajuda a compor o orçamento anual dos
promotores é o auxílio-livro. Uma ajuda extra de até R$ 1.700 por ano, criada
em 2010 com o objetivo de garantir a atualização técnica dos promotores e
procuradores.
Entre 2010 e 2013, o advogado Rodrigo Xande Nunes
trabalhou como oficial de Promotoria dentro do MP, cuja tarefa era solicitar
verbas indenizatórias para os promotores e procuradores que assessora. “Bastava
o promotor apresentar uma nota fiscal de qualquer livraria com a descrição
‘livro’ para assegurar o reembolso. Vi livros de doutrina jurídica que iam
parar nas mãos de sobrinhos do promotor que estavam cursando faculdade de
direito, ou romances virarem presentes de aniversário”, lembra.
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